segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Breve resposta ao vídeo Tempestade em Copo d'água

Por Leandro Costa Ferreira Gomes


É triste que a argumentação se dê somente em cima de argumentos técnicos, fugindo de qualquer debate sobre quais sejam os reais interesses sendo atendidos com a construção dessa obra e passando por cima de qualquer consideração sobre os povos indígenas e ribeirinhos, afinal floresta é floreste né, joga eles em algum outro canto e tá resolvido. Não ouvi sequer a palavra alumínio, alcoa, alumar, alunorte, vale do rio doce ou outras eletro-intensivas como suzano, cemig, usiminas, votorantim e por aí vai, para não falar na odebrecht. Mas é só porque faltou tempo, o estúdio tava muito caro.

Não vi o vídeo citar nada sobre todos os atropelos jurídicos e constitucionais para construção da obra às pressas, nenhuma explicação sobre o porque o custo da obra ter subido de 10bi em 2001 para 30 em 2011 (isso na melhor das situações que li, há quem fale da obra ter saído de 4.5bi em 2006 e ter atingido o valor atual). Só para se ter uma idéia, a usina de três gargantas na china, a maior do mundo em capacidade instalada, com 20.3GW de potência instalada e QUASE O DOBRO de Belo Monte custou cerca de US$23, uns 35bi de reais. Acontece que, além de ter quase o dobro de capacidade instalada e da barragem em si ser bem maior, eles tiveram os custos de realocar 1.3 milhões de pessoas, custo incluído no valor acima, preciso falar nada né...
 
Também não vi eles falarem de todos os problemas que o canteiro de obras trás à cidade que o recebe como aumento da violência, de doenças, da prostituição e que só tende a piorar com o término da obra já que esses caras vão ser deixados à própria sorte. Eles também falam de compensações sociais e já "esqueceram" que cerca de 150 trabalhadores já foram demitidos por reivindicar melhores condições de trabalho, e olha que a obra mal começou. Parece que o mito do progresso e desenvolvimento andou ludibriando-os, pena que a única coisa que progride com essa obra é a mentalidade colonial de país exportador de matéria prima.


Também tiram dados da cartola... ou fugiram da escola...supondo que a geração anual que eles citaram, 100bi de kWh esteja certa, usando o valor que nós, usuários residenciais pagamos (que diga-se de passagem é o mais caro), algo em torno de 40 centavos o kWh daria 40bi, frisa-se, de receita bruta. Acontece que o valor da energia vendida no "livre mercado" de energia (livre para quem pode negociar livremente) é estupidamente inferior à isso. Para se ter uma idéia, a vale renovou seu contrato de compra de energia ao preço médio de US$18,00 o MWh até 2024 no MWh, ou seja, cerca de 3 centavos o kWh. Aliás, que diferença em relação ao que nós pagamos (e se alguém pagar o mesmo preço que paga hoje até 2024me avisa que quero saber de onde compra)! Ah... as perdas em transmissão em cerca de 15% para trazer para o sudeste e/ou nordeste também não costumam entrar no balanço...pra não falar nas obras bilionárias dos troncos de transmissão que incluem não apenas as linhas, mas as estações conversoras do HVDC e muita grana pra ABB.


"Esqueceram" de falar, ou as fontes que eles repetiram, não lhes falou das 4 usinas rio acima que vão matar de vez o rio Xingu e que o fato de gerar pouco em alguns períodos do ano servirá de justificativa para construção das seguintes, já que a vazão do rio será "regulada". Bom, tem as outras grandes obras na Amazônia como a UHE de São Luís de Tapajós e a Teles Pires, já em avançado processo de negociação.


Pra finalizar, acho que o pessoal da economia fugiu da aula de juros composto e o pessoal da civil não entendeu muito bem a função exponencial, que dizer do logaritmo. Vamos aqui fazer alguns cálculos simples, só para ilustração: pensando numa correlação entre crescimento econômico e aumento da capacidade instalada de energia em 1 para 1, ou seja, crescemos 1% do pib e aumentamos em 1% a capacidade instalada. Agora, tomando a prospecção de que o potencial hidráulico na região amazônica é de cerca de 200GW, cerca do dobro atualmente instalado e que vamos crescer no limiar dos economistas de 3% ao ano, em apenas 37 anos já engolimos uma bacia amazônica. Ou seja, demoramos 500 anos para chegar a 100GW instalados e em 40 chegaremos a 200! E pensar que a China tem 900GW instalados e quer chegar a 2020 com 2000GW, vamos ter que fazer um gasoduto do Sol pra Terra pra trazer hidrogênio!


Enfim, se não morrer de raiva ou de infarto vendo isso, acho que vou ter que assistir aos outros 77 vídeos das próximas obras planejadas para a região amazônica e quizá de alguma ou outra nuclear instalada na porta da minha casa.


Pra finalizar uma citação:
"Anyone who believes exponential growth can go on forever in a finite world is either a madman or an economist." Kenneth Boulding, economista


A crítica desse texto refere-se ao vídeo abaixo:


Nenhum comentário:

Postar um comentário